domingo, 30 de setembro de 2012

[Tradução] Entrevista para a Best Fit (Parte II)


Finalizamos a tradução da entrevista para a Best Fit com as falas que vão de Star of Wonder até Maybe California. Destaco as razões para a entrada da canção do Midwinter Graces no disco, a emotiva imagem que Tori tem hoje quando canta Winter e o background de Marianne e Girl Disappearing... Espero que gostem, e para ler a versão original, clique AQUI.

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STAR OF WONDER

Best Fit: “Star of Wonder” é sua canção favorita do Midwinter Graces?

Amos: [em tom enfático] Não! Não é. Mas eu amo tocá-la com as pessoas. Originalmente, disse a Philly: eu quero ouro, incenso e mirra chegando pelo deserto na garoupa de um camelo, faça acontecer! Aonde está minha “Caxemira”? (Kashmir, também em referência à canção de Led Zeppelin) Disse que se fossemos trazer esta canção, então que ela seria construída como um hino metodista. Lembro de quando era uma garota na igreja... Os metodistas falavam: “olhe para o que Led Zeppelin está fazendo com as garotas!” Eles pensavam que eu era muito nova para ser afetada por isso, mas - garotas adolescentes? Esqueça! Elas estavam saindo de casa, indo aos shows, seus pais não tinham mais controles sobre elas. Conhece aquele trecho bíblico: [num tom de pregador] “Cinge os seus lombos!”? Ok, esqueça - esses lombos estavam da porta pra fora! Nenhum papai iria trazê-las de volta, debaixo de briga. Então, ouvindo a música [de Led Zeppelin], isso fez sentido para mim, achava muito sensual. Eles conseguiam trazer a energia do Blues em conjunto à mitologia da Deusa, era isso que Robert [Plant] estava fazendo. Portanto, ter uma leitura Médio-oriental para algo que originalmente era um hino? Não pude resistir! É por isso que a canção entrou para o disco; por trazer num mesmo pacote um background eclesiástico, uma referência à orquestração de Zeppelin e um sentimento de Oriente Médio também.

WINTER

Best Fit: Quando você toca “Winter” ao vivo, é fácil se deparar com os sentimentos e emoções que você tinha quando a escreveu, no início dos anos 90?

Amos: Com o passar dos anos, pessoas me contaram suas histórias de “Winter”. Muita gente. Daí, quando essa canção adentra ao recinto, ela carrega consigo histórias de garotas e seus pais vindas do que parecem ser dimensões distintas. Quando encontrei “Winter” pela primeira vez, não significa que ali ela tenha nascido. Apenas que a encontrei, pela primeira vez. Ela já vive há... Só Deus sabe o quão antiga é esta estrutura. Mas é assim que vejo as canções, suas consciências. E quando eu gravei esta versão com a orquestra, não estava mais me vendo ao lado de meu pai caminhando sobre uma colina na Virginia, ou caindo de um balanço quando Poppa, o pai de minha mãe, veio me pegar. Eu vi Tash [Filha de Amos] caindo em Viena, no gelo. Estávamos de visita, passeando pouco antes de um show, e ela caiu sobre a neve. Era bem pequena e Mark [marido de Amos] a levantou. Ela havia arranhado seu joelho e estava chorando, e a imagem que eu tinha era de Tash e seu papai em meio ao gelo. Acredito nessa como sendo uma transformação amável para a canção.

FLYING DUTCHMAN

Best Fit: você disse certa vez que “Honey” era sua canção predileta do Under The Pink, mesmo ela não estando de fato no Under The Pink. De forma similar, para muitos fãs, “Flying Dutchman” é a melhor canção da era Little Earthquakes, ainda que esta não tenha sido escolhida para a versão final do disco. Era para ela estar nele?

Amos: Era. E tive meu coração partido quando ela saiu. E é por isso que agora está tendo sua chance, 20 anos depois. Obviamente, por ser uma orquestra holandesa, “Flying Dutchman” naturalmente se mostrou e disse “ei, é minha vez”. Também, teve o Comic Book Tattoo [uma coleção de histórias ilustradas curada por Amos e Rantz Hoseley], e seu título é um trecho dessa música. Eu a escrevi sobre todos esses jovens rapazes fazendo quadrinhos naquela época, cujos pais diziam que estavam perdendo suas vidas. Rantz era um jovem que tinha um apartamento-estúdio em Hollywood, atrás da Igreja Metodista, onde costumava ir e passar um tempo com meu então namorado, Eric Rosse. Essa canção está finalmente ganhando seu espaço no século 21 com o Comic Book Tattoo, e agora com a orquestra holandesa, o que dá a ela uma carreira. Floresceu de forma tardia, mas está tendo uma festa em sua homenagem!

PROGRAMMABLE SODA

Best Fit: na batalha entre as canções curtas de Tori Amos, como esta conseguiu vencer “Mr Zebra”, “Way Down” ou até “Hungarian Wedding Song” por um espaço no disco?

Amos: a questão sobre “Programmable...” é: considerei que o arranjo poderia ser divertido, e que precisávamos de um pouco de diversão. “Mr Zebra” é muito amada pelas pessoas, eu sei disso. Foi cogitada. Eu a apresentei com Black Dykes [The Black Dyke Mills Band] no Boys For Pele. O que eu pensei foi que seria muito divertido ter uma grande orquestração para “Programmable Soda”. O processo de gravação foi ótimo.

SNOW CHERRIES FROM FRANCE

Best Fit: Ok, esse daqui passou por uma jornada e tanto, não é?

Amos: Bem, você sabe, não acho que essa estava finalizada até a versão orquestral. Vinha com uma abordagem para ela desde 1997/1998 e na época do Tales of a Librarian, pensei em segurá-la para o disco seguinte, que viria a ser The Beekeeper. Mas Matt, Jon e eu andávamos tocando tanto [canções antigas] na Scarlet tour que acabamos querendo tocar músicas que nunca tinham sido apresentadas antes. Por isso ela esteve lá, nossa musiquinha mimosa da qual gostávamos tanto. Então o think tank me disse “por que não nos debruçamos sobre ela?”. E com o passar dos anos, sempre foi uma canção muito pedida, mas de certa forma ela acabou sendo escanteada, por não ter entrado num disco... Você sabe do que estou falando [a música entrou numa compilação somente, não em um álbum de estúdio de fato]. Então ela se levantou e falou, “Eu adoraria vir para tocar com a orquestra holandesa, por favor”.

MARIANNE

Best Fit: você poderia, depois de todos estes anos, lançar uma luz sobre os versos: “Tuna / rubber / a little blubber in my igloo”?

Amos: Acho melhor deixar isso para você. Qualquer coisa que pensar é válida.

Best Fit: Escrever, gravar e tocar essa música ao vivo durante esses anos foi uma experiência catártica para você, por conta do assunto dela?

Amos: Bem... O que aconteceu durante todo esse período é que muitas pessoas vinham e me contavam sua história, sobre sua Marianne. Alguém em suas vidas que deixou o planeta cedo sob circunstâncias que soavam erradas, que não pareceram intencionais, questionáveis, entende? - esses acidentes que sempre parecem questionáveis. Olha para minha sobrinha, hoje com 20 anos, e Tash, com 12, e... Marianne morreu quando tinha 15! 15 anos para mim é muito pouco para deixar o planeta - você está só começando a viver. Essa canção tornou-se minha dedicatória e tributo ao espírito mágico que foi Marianne. Sua morte me ensinou muita coisa e eu sinto sua presença, ela caminhou comigo. Dizem que os ancestrais caminham com você e ela é uma espírito irmã. E muita gente no mundo todo tem sua própria Marianne, e é por isso que ela entrou no álbum.

SILENT ALL THESE YEARS

Best Fit: em 1997, você relançou “Silent All These Years” a fim de chamar atenção para sua instituição de caridade, RAINN (Rape, Abuse & Incest National Network). O que você acha dos comentários recentes de pessoas como Todd Akin e George Galloway sobre a definição de estupro, em face do caso de Julian Assange?

Amos: Não sei se devíamos dar crédito a isso, mas dizer que esperma saberia a diferença? E que não nasceriam crianças a partir de um estupro... Quando você pensa que alguém que está tentando uma candidatura trata de um jeito tão absurdo sobre uma questão feminina! Esse foi uma chamado para que as mulheres do mundo acordem para a necessidade de votar! Temos de estar presentes, estarmos cientes do que estas pessoas estão dizendo! “Silent All These Years” foi uma canção que... Mulheres vieram a mim, até recentemente, de todos os possíveis caminhos da vida: mulheres estas que podem até parecer muito poderosas, com trabalhos nos quais lidam com muita poder, médicas, juízas, produtoras... E ainda assim acabam envolvidas em situações de violência doméstica ou relacionamentos verbalmente abusivos, não sendo capazes de impôr esses limites. E elas me disseram que com terapia, tornando-se amigas de “Silent...” e encontrando a força para confrontar isso, estão se tornando capazes para confrontar seus problemas. É uma canção que sempre se fez presente em minha vida.

GIRL DISAPPEARING

Best Fit: No American Doll Posse, você assumiu os papéis de cinco mulheres diferentes. “Girl Disappearing” era cantada pela personagem Clyde. Ao regravá-la, assim como fez com a de outra doll, “Programmable Soda”, você sente que na prática está fazendo versões covers?

Amos: Acho que sim! Creio que sejam ambas covers, de certa forma. E também na turnê fiz uma versão de “Smokey Joe” [outra faixa de American Doll Posse] com o quarteto, mas me pareceu que... Eu preciso transformá-la numa entidade mais integrada. E essas mulheres não estão tão distantes. São extensões do ser. Mas “Girl Disappearing”, quando eu a faço como Tori, invés de Clyde, não é direcionada a mim mesma, mas a todas as mulheres. A ideia de que uma mulher pode estar de frente a outra mulher e, ainda assim, não reconhecermos umas às outras, ou não tomarmos conhecimento de nossas trajetórias espirituais. Às vezes, existe uma falta de compaixão entre mulheres. “Girl Disappearing” fez questão de estar no disco, ela me ordenou a assim fazer. Entrou no último minuto, por sinal! Ela disse, “Não vou a lugar algum! Eu, ‘Girl Disappearing’, estou aparecendo aqui!” [risos].

MAYBE CALIFORNIA

Best Fit: esta é uma faixa bônus no Gold Dust e, de certa forma, tem uma ligação temática com “Marianne”...

Amos: Senti que não são só mulheres jovens que experimentam isso [pensamentos suicidas] e era importante que mães... Você sabe, a ideia de ser marginalizada e de que as pessoas ficarão melhor sem você...

Best Fit: Se eu entendi a canção corretamente, você está dizendo a uma mãe, “não se mate, pessoas precisam de você e há mais neste mundo para você”.

Amos: Está certo. E esta decisão pode estar olhando diretamente para você agora, mas precisamos mudar o que está vendo. Pegue minha mão, pois precisamos olhar para sua vida, dez anos, vinte anos, trinta anos a partir de agora e como, sem você, muitas pessoas que ama sofrerão.

Gold Dust será lançado pela Deustche Grammophon no dia 1º de outubro (Reino Unido. Tori Amos e a Metropole Orchestra tocam no Royal Albert Hall dia 03/10.

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